Armazém 6

domingo, fevereiro 05, 2006

Desafio VII (O Fim)

Quinta-feira, 1 de Julho de 2004, 9 da manhã

Quando cheguei ao Armazém 6 fui ter imediatamente com Sapo Atropelado, que, descontraída, já estava nos chats com os amigos.
- Bom dia! Sabes, encontrámos um envelope vermelho na reciclagem com a data de 25 de Junho. Não terá sido esse envelope que entregaste a Aníbal?
- Tipo... não. Tipo, já disse, tipo naquela, que o envelope era branco e que eu o entreguei a Aníbal.
- Então que envelope é este? - perguntei, fazendo ar desinteressado.
- Tipo, sei lá! É um envelope qualquer que práí estava.
- Mas nós já tínhamos revistado aquela caixa e não tínhamos encontrado nada, sabes, é que dá ideia que alguém o pôs lá depois, na Terça por exemplo.
- Tipo, não sei. Tipo, o melhor é perguntares aos "armazenados" todos, pode ter sido um deles.
- Não haveria motivo... - já estava derrotada nesta altura.
- Olha, tipo, não me chateies mais com essa história! Os DBI desapareceram! E agora, tipo, vamos ver o que decide o Dr. Fintas.
- Tens razão, Sapo Atropleado- e retirei-me em fervura absoluta.

Comuniquei esta conversa a todos os "armazenados" e ficámos todos de acordo em manter a decisão do dia anterior.

Todos os "armazenados" trabalhavam afincadamente com dois objectivos bem definidos: Encontrar os DBI às partes, disfarçados no meio de outros documentos e manter Sapo Atropelado debaixo de olho.

Cabeça de Fósforo estava ausente e isso poderia jogar a favor de Sapo Atropelado.
Cada ida à casa de banho era escrupulosamente controlada.
Cada saída do gabinete.
Cada movimento junto da mesa com documentos.
Tudo estava no controle.
Alguns até, com pretextos bem articulados, mudaram de lugar de modo a terem uma visão mais ampla do Armazém 6 e, sobretudo, de Sapo Atropelado.

Mas nada aconteceu.
Nem rasto dos DBI.
Sapo Atropelado não se comportou de maneira diferente, passou o dia ao telefone e nos chats.

Chegaram as 18h.
Todos nós fomos embora, com o sentimento de revolta inerente ao espectáculo de uma injustiça.

Sexta-feira, 2 de Julho 2004, 10:15h da manhã

- É assim! Os DBI apareceram! - anunciou Cabeça de Fóforo para a plateia.
- Apareceram?! Onde?! Quando?! - ficámos boquiabertos.
- É assim, estavam hoje de manhã na mesa com documentos junto com os documentos trazidos pelos estafetas e não sei quê.
- Como?! - exclamei - Com que data?
- É assim, a data de hoje e não sei quê.
- Como?! - exclamei de novo.
- É assim, és surda e não sei quê?
- Como?! Como é que pode ser?! E o envelope que Sapo Atropeldao entregou a Aníbal? É o quê?!
estamos a brincar é?! Onde está Sapo Atropelado?!
- É assim, não vem hoje, parece que foi ao médico e não sei quê.
- Como?! Ao médico?! - estava de cabeça perdida.

- Olha lá - disse Surucucu - Caga nisso Bruaca, o importante é que tenham aparecido.
- Como?! Nem pensar! Exijo falar com Sapo Atropelado!
- É assim, não sejas ridícula Bruaca, Sapo Atropelado não está e não sei quê. Esperas por segunda-feira e não sei quê. É assim já apareceram e vou reportar já isto ao Dr. Fintas.

Fiquei furiosa. Não me conseguia conter e gritei histérica:
- Mas que merda! Ninguém tem inteligência neste raio deste Armazém?! Se o envelope andou perdido com os estafetas até hoje, que envelope andámos à procura desde a semana passada?! Porra!!

Ficaram estupefactos.

- É assim Bruaca. Volta ao trabalho e não chateies e não sei quê.

Voltei ao trabalho, já contando os minutos até segunda- feira.
Algumas "armazenadas" ainda se chegaram ao pé de mim com palavras de consolo, dizendo que o que era importante era que os DBI tinham aparecido.
Isto fazia-me ficar ainda mais deprimida, ninguém parecia mais importar-se com a verdade. Ficavam satisfeitas só com o facto de terem ficado livres de risco com a responsabilidade.

Segunda-feira, 5 de Julho de 2004, 9:00h da manhã

Chegou Sapo Atropelado, com ar jovial disse um "Bom Dia!" alegre e foi para o seu gabinete.

Passados uns minutos Cabeça de Fósforo, Surucucu, Aníbal e Sapo Atropelado, reuniam-se na sala de reuniões. Faziam um ar sério e preocupado.
Pensei : "É agora. É agora que finalmente vão questionar Sapo Atropleado"

Ao espreitar pela frincha da porta vislumbrei o rosto de Sapo Atropelado, vermelho e inchado que soluçava palavras disconexas.

"Foi apanhada!" pensei.

Mas...

Quando sairam, interpelei imediatamente Surucucu e perguntei:

- E então? Confessou?
- Ah. Não, coitada estava tão nervosa que nem conseguia falar, chorou muito e tudo , coitadinha. Sabes, ela estava mesmo preocupada com os DBI. Olha, deixa lá, o importante é que tenham aparecido.

(...)

Nada a fazer, engolir o sapo e pronto!
Que revolta senti.

Jurei a mim mesma que no verão seguinte compraria um poster gigante do filme "Sei o que fizeste no verão passado" e o colocaria bem à frente do gabinete de Sapo Atropelado.

Agora digam lá:
Além de umas palmadinhas nas costas de um Sapo Atropelado lavado em lágrimas,
Que aconteceu realmente?

Percebi claramente o que aconteceu:

Sapo Atropelado entregou um envelope errado a Aníbal, sem intenção, e esse era o envelope vermelho.
Ao aperceber-se do erro, voltou atrás (enquanto Surucucu estava no WC) e recolheu-o sem que ninguém desse por isso.
Sem intenção, mais uma vez, esqueceu-se de dar o verdadeiro envelope a Aníbal ou mesmo a Surucucu.
Afogada em mensagens de messenger e icq, não voltou a pensar mais no assunto.
Quando explodiu a bomba sobre os DBI, não quer dizer que afinal se tinha esquecido de dar o verdadeiro envelope. (Até porque Dr. Fintas já tinha sido informado).
Deixou correr o caso.
Terça-feira, deitou fora o envelope vermelho.
Quarta-feira não veio trabalhar.
Quinta-feira meteu os DBI no correio interno com a data do dia.
Sexta-feira não veio trabalhar.
E, provavelmente, durante o fim de semana pensou :" Os DBI vão aparecer, e todos vão pensar que andaram perdidos no correio interno"...

Pois, teve pouca inteligência.
Mas, não menos do que aqueles que lhe deram a palmada nas costas quando se lavou em lágrimas dizendo aos soluços:
"É verda...de, estavam no correio inter...no... Nããoo seei! Chuiff chuiff"

A minha conclusão é esta e é, sobretudo, a de que safa-se quem está por cima e não precisa de ser mais inteligente do que os outros. E quem consegue sentir-se bem no presente rapidamente esquece as injustiças que lhes foram cometidas no passado.


FIM

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